A importância de correr riscos na infância

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Os riscos fazem parte da nossa vida, desde sempre e para sempre.

Saber da sua existência e aprender a lidar com situações arriscadas é fundamental para criar crianças (e, consequentemente, futuros adultos) mais seguras, confiantes e resilientes!

Ao correr riscos, a criança também compreende melhor as suas capacidades, habilidades e os seus limites. Ao tentar experiências novas, a criança percebe até onde pode/ consegue ir.

Se deixarem os vossos filhos livres para tomar as suas decisões e testar os seus limites, provavelmente eles irão surpreender-vos fazendo algo que vocês achavam que não iriam conseguir.

Crianças que lidam com desafios e situações de risco durante as brincadeiras, quando chegarem à idade adulta terão mais facilidade em tomar decisões mais arriscadas por estarem habituadas a lidar com situações que saem da sua “zona de conforto”.

É importante referir que correr riscos é diferente de correr perigo.

Deixar a criança correr em piso irregular sabendo que pode cair é um risco, não só aceitável como até saudável. Deixá-la espreitar sozinha uma janela aberta é um perigo – inaceitável e demasiado perigoso.

Dei dois exemplos completamente opostos mas que espelham bem a diferença entre a palavra risco e perigo.

Eu deixo a minha filha correr riscos e ela, sozinha, por vezes, coloca-se em perigo: quando escala algo de onde não consegue sair ou quando se pendura em objetos que poderão cair com o seu peso.

Mas ela não corre perigos por vontade própria, arrisca! E, ao arriscar, por vezes, acontece ter que pedir ajuda para descer de certos sítios.

E não me refiro a locais onde podemos incentivar a “subiste sozinho, anda que também consegues descer”. Refiro-me a locais demasiado altos e/ou instáveis de onde não conseguiria mesmo descer sozinha.

O que posso fazer para impedir que isso aconteça?

Nada! Apenas orgulhar-me de a ver arriscar e estar mais atenta para tentar que apenas corra riscos e não se coloque em perigo.

As crianças vivem no presente! Para elas só existe o aqui e agora.

Vejamos: A criança quer algo que está fora do seu alcance, o adulto está a lavar loiça. A criança até pode pedir ajuda mas, se o adulto não poder ir no momento, é muito provável que a criança recorra a objetos que estiverem por perto para tentar alcançar o que pretende (mesmo sabendo que é algo que não deve manusear sozinha).

Quando a criança tem um objetivo não calcula perigos, apenas tenta alcançá-lo!

Se quer chegar ao cimo de um armário e está uma mesa/ banco/ algo que possa empilhar por perto, vai fazer uso do que tem para alcançar o que pretende, naquele momento!

Exemplo prático:

Caetana pediu-me um chupa chupa perto da hora de almoço. Apesar de já saber que não come doces de manhã, de vez em quando tenta a sua sorte. Estar em cima da hora de almoço não abonou a seu favor.

Disse-lhe que não pois iria comer a sopa dentro de alguns minutos. Mas entretanto tive que ir à casa de banho.

Os chupa chupas estão no cimo deste armário. À vista mas fora de alcance – da mesma forma como há materiais e jogos que só utiliza com supervisão/ ajuda e estão na prateleira mais alta deste armário. O objetivo é que Caetana veja mas peça, para que não utilize sozinha.

Mas ela queria o chupa chupa naquele momento e percebeu que eu não lho ia dar. Da mesma forma que percebeu que eu estava na casa de banho e achou que chegava ao cimo do armário antes de eu me despachar e poder impedir.

Claro que não pensou em como iria abrir o chupa chupa sozinha nem tão pouco como teria tempo de o comer antes de eu sair da casa de banho.

Pensou no “aqui” e “agora” e “aqui” e “agora” naquele momento significava chegar ao cimo do armário e tirar um doce!

Eu, adulto, ao sair da casa de banho e deparar-me com este cenário, visualizei logo duas situações impeditivas do sucesso:

  • Os livros estavam mal apoiados, cairiam assim que Caetana colocasse um pé em cima deles – e a miúda caía com eles;
  • Mesmo que estivessem bem apoiados, não tinham altura suficiente para chegar ao cimo do armário.
  • Além do que já referi antes: Caetana não consegue abrir chupa chupas sozinha e não teria tempo de o comer sem ser “apanhada”.

Ralhei? Castiguei ou expliquei?

Expliquei!

Reforcei que lhe tinha dito que não ia comer chupa chupa aquela hora – de manhã e em cima da hora de almoço – pois iríamos almoçar dentro de poucos minutos.

De seguida expliquei que, o que estava a tentar fazer era extremamente perigoso. Além de não chegar ao cimo do armário, tinha os livros mal apoiados e iria cair ela e os livros, acabando por se magoar, podendo magoar-se mesmo a sério!

No final ainda chamei a atenção de que os livros não são escadotes e muito menos servem para colocar os pés.

Lição aprendida!

Recentemente apareceu na sala com um objeto que estava dentro do armário, na prateleira mais alta.

Fui de imediato ao quarto, para perceber como tinha chegado lá acima e vejo isto:

Onde está a aprendizagem? Caetana já utilizou algo mais estável. Não deixa de ser ligeiramente arriscado porque, como podem ver, não está completamente apoiado. Mas sempre está mais estável do que os livros. E, reparem bem, utilizou um objeto que serve mesmo para esse fim: chegar mais alto!

Não escondi nenhum dos objetos envolvidos. Caetana tem força suficiente para ir arrastando a mesa, o banco, os livros e tudo o que pretender para tentar fazer torres no quarto.

Resta-me apenas explicar-lhe que, dessa forma, correrá perigos desnecessários porque, se me pedir o que pretende, eu chego lá sem perigo algum. E confiar que não volta a repetir este tipo de situações.

Na verdade acredito que poderá repetir pois estamos muitas vezes só as duas em casa e é comum eu não poder ir logo fazer o que pretende. Quando digo não poder ir logo, refiro-me a demorar alguns minutos, os suficientes para que a (pouca) paciência de uma criança a leve a tentar sozinha.

E está tudo bem. Demonstra autonomia e resiliência em resolver as situações à sua maneira!

Carolina Valente Pereira

Gosto de ler, escrever, partilhar factos, aventuras, opiniões e brincadeiras

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